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Profissão:
Cantor de Barzinho


Saiba tudo sobre o dia a dia de um artista da noite e suas vantagens e desvantagens

(20/04/2012)

A profissão de músico no Brasil, todos sabem, não é fácil como se parece. Sem ajuda de jabá ou Q.I, o  profissional tem que ralar muito pra se chegar ao estrelato ou a seu objetivo principal. Dia desses, em algum dos bares da vida que frequento pelos finais de semana, me dei conta de uma função ainda mais penosa: a de cantor de bar. É, meus caros, cantar em barzinho não é só arranhar um violão, colocar os ritmos do momento e cantar. É preciso mais, pois a estrada é sinuosa. Além de dominar um violão, por exemplo, você precisa antes de mais nada agradar ao dono do estabelecimento, já que ele quer que seus clientes fiquem à vontade. Para isso, você tem que possuir uma voz agradável, afinada e conseguir acompanhar o ritmo na medida certa. Isso sem falar no seu carisma. Essa palavrinha aí é bonita e vale muito. Quem consegue cativar o público com seu jeito e sua originalidade, já tem meio caminho andado pra sair dali referenciado e quiça, pronto pro mercado, caso esse seja a sua meta.

Mas sem querer jogar uma ducha de água fria, quem pensa que o cantor de bar só vive de vantagens, está redondamente enganado. Por experiência própria, digo e repito: esse profissional vai ´´comer o pão que o diabo amassou``durante suas apresentações. Vamos ser sinceros: poucos se interessam em escutar quem está tocando em tal bar e o que está tocando. Muitos, inclusive, reclamam por serem obrigados a pagar o tal "couvert artístico". Isso sem falar nos comentários maldosos sobre o repertório do cantor ou de sua voz. O certo é que, na falta de alguém mais interessante para criticar, na falta do que fazer, preferimos falar do cantor de barzinho. Pra início de conversa é um trabalho árduo, rotineiro, sob regras, mediante contratos. Agendas têm de ser cumpridas, não pode ficar doente, não pode estar "mal", deprimido... Enfim, tem que estar "em dia" com a voz.

Se você é postulante a cantar em barzinho, veja bem o que vou dizer agora. Ponha-se no lugar desse profissional. Ele está ali, cercado de gente que não presta atenção, observa as pessoas em grupo, comendo, rindo , namorando e discutindo. Já ele se encontra numa espécie de  isolamento, sentado em um banquinho, junto a uma mesa, onde só se vê uma garrafa d'água. Em alguns bares mais decentes oferecem cerveja ou refrigerante. Mas, no que pensa aquele indivíduo, sozinho com seu violão, sendo obrigado a seguir um repertório em sua maioria de músicas batidas de MPB? Começa a sessão Djavan, porque não pode faltar " Teus sinais, me confundem, da cabeça aos pés. Mas por dentro, eu te devoro``... Ouve alguns aplausos (isso quando aplaudem, pois as vezes o cantor fica no vácuo) e esboça alguma reação.

Ao que minha experiência indica, parece que para ser cantor de barzinho, o sujeito deve fazer um curso intensivo de Djavan, Cazuza e Ana Carolina. Ou você aprende uma ou duas músicas de cada ou jamais será um cantor de barzinho decente. É bem provável que as pessoas não prestem atenção no artista, já que os petiscos e as companhias, na maioria das vezes, são mais interessantes. Nessa hora rola uma boa vantagem para o músico. Quase ninguém presta atenção se a letra está errada em algum momento, muito menos se algum acorde foi inventado.  A verdade é que se você tem um violão jamais estará em perigo em se tratando de MPB: invente qualquer coisa, dedilhe e cante Cazuza. Na dúvida, toque Legião Urbana. "Será" é sempre uma boa pedida !

O público, que muitas vezes não dá importância para o cantor no barzinho, tem também sua faceta exigente. Ainda mais quando há algum destemperado na platéia. Certa vez presenciei um caso exemplar. Um sujeito, com teor alcóolico alto, pedia desesperadamente para o cantor do barzinho tocar "Espanhola" . O músico inicialmente fingiu não escutar, tocou outra coisa. O sujeito então, embriagado, insistia e entoava os versos do refrão em voz alta: "Te amo Espanhola Te amo Espanhola Se for chorar Te amo..." A irritação no semblante do cantor era visível que, no momento, tocava uma canção de Ivete Sangalo. Porém, nesse momento o bom senso do artista tem que existir: desvencilhar-se do chato de plantão sem ser mal educado. E foi isso que aconteceu. Com educação, ele não fez a vontade do antipático sujeito, mas prestou-se a tocar outras músicas do 14 Bis, mostrando ética e diplomacia.

Como se pode notar, o cantor de barzinho também tem coração, é uma pessoa, assim como nós. Sabe o que agrada e o que desagrada, tem fome, inspiração, irrita-se, enfim, tem sentimentos. Depois de duas ou três horas expediente, deve ser duro escutar comentários  como " Que cantor desafinado",  "Essa música eu escuto em todo lugar.  "Nossa, 7 reais de couvert artístico? Que roubo !". O cantor faz de sua profissão uma paixão não apenas em sua própria vida, mas leva alegria e satisfação aos que servem com sua preciosidade. Mas a vida deste profissional da emoção é uma das mais difíceis; não por oferecer riscos, mas por ser muito trabalhoso o processo, árduo o exercício e demorado o reconhecimento, quando este acontece, claro, porque na grande maioria das vezes os profissionais da voz até mudam de carreira simplesmente porque não conseguem uma posição que garantam a sua sobrevivência.

Se você pensa em cantar em barzinho mãos à obra. Estude, toque um violão ou se seu forte é a só a voz, junte-se a algum instrumentista de sua confiança. Dê preferência a pessoas que gostem do mesmo estilo que esse que você quer tocar. Grave um demo (CD ou MP3 com você cantando) em qualquer estúdio de gravação e vá de porta em porta de cada bar que queira tocar, a fim de mostrar o seu trabalho para o dono. Se ele saprovarem, irão te chamar para cantar lá. Normalmente eles começam colocando os novatos pra cantar quarta ou quinta feira. Se gostar da sua apresentação, ele te encaixa em dias mais cheios, como sextas e sábados. Se for direto pra sexta ou sábado, então, ótimo ! Mas não esqueça de tomar bastante água, pra que sua voz fique mais preparada. Jamais abuse da água gelada nas apresentações. E se você quer ir mais além, faça um curso vocal paralelamente. Dicas como essa são importantes no cotidiano de um aspirante a músico. Se você tem um sonho deve partir pra luta e realizá-lo. Avante, guerreiro !


Marcus Vinicius Jacobson

Jornalista e diretor do MVHP - Portal de Cifras
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